Cultura viking e suas peculiaridades
- Anhembi Digital
- 27 de fev. de 2019
- 7 min de leitura
A história dos povos “bárbaros” e a influência nórdica na gastronomia, literatura e arte no ocidente
Por Beatriz Dias, Caroline Martins, Flávia Ambrósio, Leticia Gregorio e Nathalia Ferreira

A cultura que temos hoje é fruto da apropriação histórica e cultural de diversos povos que viveram entorno dos continentes ao longo do tempo. Os processos de imigração e colonização foram muito importantes para o contraste cultural dentre diferentes sociedades. Sendo assim, recebemos também a influência dos povos nórdicos, vikings ou escandinavos. É perceptível a presença da influência dessa cultura atualmente em alguns âmbitos culturais como: gastronomia, comportamento, jogos, séries, filmes e música.
Diferente do que muitos pensam, os países nórdicos não são os mesmos dos escandinavos. A região escandinava é composta pela Noruega, Suécia e Dinamarca, enquanto a região nórdica é constituída pelos países escandinavos, Finlândia e Islândia. A região nórdica é carregada de lendas, que seriam consideradas a religião desses países anteriormente à invasão pelos povos cristãos, especialmente durante a Era Viking (800 d.C. - 1066).
A mitologia nórdica por não ter sido registrada em livros tem diversas versões e interpretações. A arte e a literatura são uns dos principais segmentos que mais propagaram a influência que receberam da mitologia nórdica, trazendo-a para o Ocidente.
A invasão dos países do Norte pelos cristãos gerou a catequização desses povos que foram por muitos denominados de bárbaros, termo que é variação de barbárie, e ocasionou o esquecimento das antigas histórias mitológicas. A Islândia foi exceção perante a influência cristã, já que a velha mitologia nórdica continuou como uma herança cultural, transmitida oralmente e preservada em peças escritas, como as Eddas.
Gastronomia Nórdica

Em São Paulo, há espaços que tentam recriar o cenário nórdico, escandinavo e até da idade média, encaixando pontos em comum entre eles. Como no caso do restaurante “O escandinavo”, em Pinheiros, que não só apresenta a culinária da época como único e principal enredo, mas também expõe em sua decoração artifícios simbolizando o “viking”, mostrando um novo contexto de espaço e de gastronomia não tanto explorada no Brasil.
Já o restaurante “Taverna Medieval”, localizado na Vila Clementina, desenvolve somente a parte temática, procura e leva genuinamente o foco a hábitos e costumes da época. Tem área tratada como os jogos de runas das quartas-feiras aos sábados e também com jogos de arco e flecha de sexta-feira a domingo.
Levando para um lado um pouco mais tradicional, há também o restaurante “Svanen Scandinavian Food”, localizado no Campo Bello, que possui Vera Jacbsen como chefe de cozinha e proprietária do local. Há 50 anos ela e o marido que viria a trabalho chegaram da Escandinávia e revelaram a culinária dos países escandinavos ao Brasil.

Vera e sua equipe estiveram em novembro de 2018 na Feira Escandinava em São Paulo que acontece há mais de meio século reunindo produtos da Dinamarca, Suécia, Noruega e Finlândia. A feira sem fins lucrativos nasceu da igreja onde mulheres vendiam artesanato a fim de ajudar em causas nobres como na doação de orfanatos. Susane Amme, de 55 anos, nascida na Suécia, é organizadora da feira e conta que quando criança tem lembrança de fazer bonecas para vender nos bazares organizados pelas igrejas.
A feira tem como público-alvo principalmente imigrantes e descendentes que buscam especialmente por produtos da região nórdica, como Wolfgang Purtzrigal, alemão aposentado de 69 anos, que não perde uma edição do evento a procura de produtos.
Mitologia
Devido ao processo de invasão sofrida pelos países do Norte a mitologia dessa sociedade pouco sobreviveu ao processo de cristianização. Esse povo não dominava a escrita, causando a raridade de registros sobre a religião viking e posteriormente a variedade de interpretações e versões das mesmas histórias.
Esses poucos registros que foram escritos próximos ao fim dessa civilização estão organizadas em Eddas poéticas, que são um documento religioso que reúnem poemas que narram histórias dos deuses nórdicos em formato de livro como explica Renata Saladino, uma das poucas estudiosas sobre o tema.
Formada em Letras, terapeuta holística, historiadora, astróloga, jogadora de runas e
“asiatronic” (pessoa crente na religião nórdica), ela diz que os contos nórdicos sobreviveram também pela oralidade abrindo espaço para as diversas versões existentes da mitologia nórdica em diferentes localidades. As raízes dessas lendas resistem ao tempo assim como a popularidade de alguns deuses perante outros, como no caso de Odin, Thor e Loki evidenciados pela historiadora:
Odin: Existem várias versões da história desse deus, porém as mais pertinentes que Odin era um homem mortal que através das suas conquistas e glórias alcançou o estatuto de deus. Outra é que Odin é o último de uma linhagem de deuses, mas em ambas ele é o deus herói que se sacrificou inúmeras vezes pela Asgard;
Thor: O deus do trovão e protetor da humanidade, filho de Odin;
Loki: Deus da mentira e da enganação. Filho adotivo de Odin. Existem relatos de que Loki era príncipe de um reino inimigo e que em uma batalha contra essa civilização Odin o adotou;
Agurbod: Asgardiana, existe lendas que ela é mulher de Loki e em outras ela é sua amante. Mãe dos filhos de Loki;
Hell: Filha de Loki, deusa da morte;
Frigga: Casada com Odin é tida como a mãe de todos. Não é tida como a mais bela e sim como a mais amada, passiva, nas histórias em que Odin a trai, ela acolhe até mesmos os filhos bastardos, principalmente por conta das regalias oferecidas a ela por isso como vestidos e joias.
Hoder: Filho de Odin e Frigga, cego e herdeiro do trono, caracterização do deus imperfeito.
De acordo com Renata, a principal história dessa mitologia é o Ragnarok, que narra o final dos tempos e o renascimento da humanidade. Tudo se inicia quando Odin manda matar Agurbod e aprisionar os três filhos de Loki despertando sua ira. Como vingança ele decide levantar o Ragnarok que tem seu ponto de partida a morte de Hoder. Este é um processo que dita a morte de todos os deuses, a subida dos mortos em um navio e o fim da humanidade, sobrando apenas um deus e um casal humanos.
Outra lenda importante são as runas que possuem origem mitológica. “Odim haveria ficado pendurado em uma árvore durante sete dias e sete noites sofrendo com o vento e os galhos batendo nele e no último dia as runas caíram das árvores”, explica Renata. As runas formam o alfabeto antigo denominado de futark e existem diferenças de acordo com cada país, variando de 16 a 36 símbolos.
O povo viking usava esse alfabeto de maneira literal para informar distâncias, números de soldados nas batalhas e contar histórias. A escrita era feita de maneira orgânica seguindo as formas das pedras e galhos, materiais utilizados não obedecendo nenhuma norma.
As runas também eram muito usadas, e até hoje são, de maneira mística. O jogo era esquematizado no chão em um ritual e lido por um mago que fazia três círculos, simbolizando

respectivamente o centro para as extremidades, o futuro da pessoa que está consultando as runas, os deuses e as catástrofes naturais que influenciariam diretamente a vida do indivíduo.
As runas receberam influência cristã, causando algumas variações, como a pedra vazia simbolizando Odin (fazendo menção ao Deus cristão). Atualmente, existem poucas pessoas que sabem lê-las, são usadas em consultas particulares, tratamentos holísticos e em uma arte corporal desenvolvida a partir dos símbolos rúnicos denominada de Galdra, que funciona semelhante ao yoga.
Influência na música e no audiovisual
No Brasil, uma das principais referências musicais que possui interferência nórdica atual é a banda Armored Dawn. Criada em 2014 no estado de São Paulo o grupo é composto por Eduardo Parras (vocalista e idealizador da banda), Timo Kaarkoski (guitarrista), Fernando Giovannet (baixista), Tiago de Moura (guitarrista), Rafael Agostino (tecladista) e Rodrigo Oliveira (baterista). A banda consolidou-se a partir do encontro de Eduardo e Timo que por ser finlandês tem vasto conhecimento sobre a cultura nórdica, o que agregou muito para a construção da identidade da banda, como afirmam os integrantes.

O grupo já fez duas turnês na Europa. Timo conta que tiveram contato direto com a cultura, gastronomia e o clima. A primeira experiência influenciou de maneira significativa no segundo álbum da banda “Power Of Warrior” de 2016. A inspiração viking presente na banda vem principalmente da perseverança e persistência presente nas batalhas, por dizerem que apropriam da natureza fria desse povo em suas músicas, clipes e na postura do grupo.
Rafael conta que na Europa o público é mais maduro e varia entre 30 e 50 anos. Entretanto, no Brasil os fãs são mais jovens, entre 16 e 25 anos especialmente das regiões sul e sudeste. A banda conta com o apoio do fã-clube Dragon Club que é responsável por organizar jantares medievais e eventos com a presença da banda.
Já tocaram com as bandas brasileiras Angra e Tuatha de Dannan (banda mineira com temática celta) em diversos festivais, como o maior deles chamado “Folk Fair”, que acontece a cada 3 meses em São Paulo, Minas Gerais e na região Sul do país. Deram destaque para inspiração ligada a produção do palco e a proposta do show como incluir lutas e batalhas medievais no decorrer da apresentação.
Como referência estrangeira, citam a Amon Amarth, que tem em comum a temática viking. É originária da Suécia. Formada incialmente com o nome de Skum em 1988 e em 1992 a banda trocou de nome para Amon Amarth. Faz parte do estilo Darth Metal, considerado o maior conjunto musical que se inspira na cultura viking, tendo 16 discos em sua discografia.
Outra cantora de nacionalidade nórdica, mas que possui influência da cultura pop em suas

músicas é Aurora Aksnes de 22 anos, ficou conhecida no ano de 2014 quando assinou seu primeiro contrato com agência Made Management e logo depois com as gravadoras Glassnote e Decca. Aurora fez uma participação na novela Deus Salve o Rei da Rede Globo, que possuía como tema de abertura sua música Scarborough Fair.
A novela contou de uma forma cômica o contexto do cotidiano, das guerras e conflitos da idade média, surgindo no auge das séries estadunidenses Game of Thrones e Vikings, que serviram de inspiração para a criação do cenário da época escolhida.
A série “Vikings”, de 2013, transmitida pela Netflix, conta a história de Ragnnar que foi o maior guerreiro de sua era e acaba tornando-se Rei da tribo vikings, além de seguir e ser devoto aos deuses.
“Game Of Thrones”, série norte-americana com primeiro episódio transmitido em 2011, também tem forte influência escandinava em seu roteiro, o clima de batalha presente, possui aspecto que é muito relevante na cultura nórdica. Além de tudo é visível a importância que os produtores deram para a história nórdica, tentando reproduzir lendas e a mitologia.
Dentre os filmes mais populares que se referem à mitologia nórdica está “Thor”, em suas versões: “Thor” de 2011, “Thor: O Mundo Sombrio” de 2014 e “Thor: Ragnarok” de 2017, que contam a história do Deus do trovão. Os roteiros da trilogia têm uma versão peculiar e distorcida sobre os mitos do nordismo e divergente do que conta a historiadora Renata Saladino. Diversos longa-metragens também incorporaram o estilo viking em seu script como o “O 13º guerreiro”, de 1999, que tem em seu elenco Antônio Banderas, “Vikings, os conquistadores”, de 1958, e a animação “Como treinar o seu dragão”, de 2010.
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